Tenho-o
referido insistentemente: a Europa não é a principal culpada desta crise
global, mas é amplamente negligente pela não saída da mesma. A Europa foi
contaminada por esta crise, mas é agora a Europa que contamina. Pela via
profissional, participo regularmente em conferências globais, mas também a
outros títulos, em fóruns de opinião. A lógica e as conclusões são uma constante
ou repetitivas. É uma humilhação para a Europa, quando se revê o “Outlook” da
actividade económica. Sem excepção, em todas as outras regiões do Planeta se
aborda a necessidade de recursos para fazer face à expansão económica. Quando
chega a vez da Europa, o tema único é a redução da actividade económica, logo o
nível de Restruturação necessário para fazer face à quebra de encomendas. Nas
outras regiões, fala-se em novas unidades industriais, na Europa fala-se em
fechar fábricas. Nas outras Regiões, prospera o emprego, na Europa aumenta-se o
desemprego. E, perante isto, qual é a receita dos Políticos? Nas outras regiões
estimula-se a economia, na Europa perante a recessão injecta-se austeridade em
vez de Incentivos ao crescimento. Em tempos de crise, o Estado deve inflectir o
ciclo e não agravá-lo. Deve ser o contra-ciclo e não o incendiário. Não sou
fundamentalista. Defendo pontualmente a austeridade do estado em prol de mais competitividade
das empresas. Jamais defenderei austeridade nas actuais circunstâncias. Pela
dose, ou porque o produto interno bruto está numa escalada de recuo.
Os meus
colegas das outras regiões perguntam-me repetidamente: quando é que aí na
Europa resolvem o problema?! Consigo até fundamentar pela lógica da Economia.
Mas a questão é política. Sim, mas eu diria, também, cultural (explico a seguir
porquê). A forma como a Europa é hoje humilhada, é análoga à forma como o resto
do planeta ridicularizava os Estados Unidos de George W. Bush. Lembram-se? Pois
apetece-me sentenciar que “Angela Merkel é hoje o G.W. BUSH da Europa”.A questão fulcral é Política, mas também cultural. E porquê? Respondo duma forma simples e banal: Porque a Alemanha de Merkel quer agradar aos Alemães. A estes e só a estes na sua plenitude. A Europa é um mal menor, ou redutora, na sua concepção. Esta visão é errática. A Alemanha beneficia desta Política, numa perspectiva de curto prazo, é certo. Mas não a médio prazo. O mercado da zona Euro é o valor acrescentado para a sua alta tecnologia e capacidade produtiva. A Alemanha exporta principalmente para a União Europeia. Logo é a principal interessada em liderar uma ampla economia com moeda única e forte. Na Zona Euro, os produtos alemães são altamente competitivos, pela sua Inovação, mas também porque os outros Países perderam um instrumento financeiro: a desvalorização cambial. A competitividade das exportações é protegida pelo Moeda (Euro). Esta é a fórmula perfeita: Estabilidade cambial, Acessibilidade, Mercado amplo, Custo baixo, Inflação controlada, Taxas de juro baixas. Isto parece ideal, mas tem um problema: acrescenta dívida a quem não produz, mas que compra à Alemanha. A dívida tende a aumentar e não a baixar. Se a tudo isto, adicionarmos a Austeridade, imposta por Merkel, temos um efeito explosivo. A corda tende a rebentar. E acabará por rebentar no coração dos Alemães, ou seja, na sua Economia. Por exemplo, imaginem se começa a implosão das economias dos Países periféricos, e mais tarde do centro da Europa? Pois, se isso acontecer nos outros Países (“menores” para a Alemanha) é a própria Alemanha que vai pagar a factura mais elevada. Deixo uma interrogação elucidativa: Que vai fazer a Alemanha aos seus magníficos produtos e serviços, se perder o mercado? Qual vai ser o ratio de desemprego, na Alemanha, se potencialmente perder os clientes que lhe auferem 50% do que produz?
Ora , esta é a questão diferenciadora. Obviamente, não sou estúpido ao pensar que são estúpidos os concelheiros e Economistas de Merkel. Tenho a certeza que este cenário é ponderado, e que avaliam o risco que induzem com esta política. Estou por isso convencido que no pós-eleições (lá está a cobardia!) vão finalmente tomar as Iniciativas adequadas. Não têm coragem de o fazer antes pela questão cultural que referenciei. Os Alemães olham para a Europa com um “fardo” que eles têm que financiar, que têm que pagar. Isto ouve-se nas ruas: «estamos nós aqui a trabalhar e pagar impostos, para pagar as dívidas dos preguiçosos dos Países do sul da Europa, qua passam o tempo na praia a apanhar sol!».
Este é o paradoxo difícil de inflectir na mente dum Germânico. Difícil explicar que a Alemanha ganha mais do que perde com a União Europeia. Mais, em tempos de crise só acrescenta, nada diminui ou perde. Pois esta é uma ideia perversa. Ultraconservadora e retrógrada. A Alemanha é quem mais ganha com uma Europa forte. Não existe uma Europa forte sem a Alemanha, e jamais existirá uma Alemanha forte sem a Europa. Por isso, a Alemanha em vez de nos dar a receita da austeridade, deve-nos promover mais trabalho, mais incentivos para acrescentarmos mais, na cadeia de valor dos produtos. Gerar mais riqueza, não recessão. Mais trabalho, não menos trabalho. Esta dose de austeridade subverte essa lógica, pois nas actuais circunstâncias, induz mais desemprego, menos actividade económica. Afinal, está a promover mais “praia e sol” em vez de crescimento, e mais trabalho, repito. Ora, esta tendência leva ao empobrecimento, e no final à não compra dos magníficos produtos Germânicos. Está ou não está esta lógica subvertida?! Sim, está, mas não no orgulho dos Alemães. Esta metamorfose é inimputável, na concepção que eles têm dos demais. Eles não se importam com o futuro e as potencialidades da construção Europeia. Eles preocupam-se em castigar os preguiçosos dos Países do Sul. A punição destes é a sua vitória. O empobrecimento destes é a sua glória. A humilhação destes é a apoteose do seu orgulho. Sei do que falo, meus amigos, pois trabalho todos os dias com eles. Da minha parte reconheço-lhes mais virtudes que defeitos, é certo, mas é esta mentalidade que ganha hegemonia, e que pode culminar no pecado mortal.
Ora, é aqui que entra Angela Merkel. Como líder é fraca. Como estadista uma futilidade. Não tem um plano para a Alemanha, muito menos para a Europa. Governa ao sabor do vento. Esse sabor é partilhado em pleno pelo “tal” orgulho germânico. A visão que tem da Europa é redutora. E curta, porque é de curto prazo. A única métrica que a preocupa são as sondagens locais. Mostra mais interesse com umas quaisquer eleições regionais que com o supremo interesse Europeu.
São assim todos os Alemães? Não, longe disso massificar os maus exemplos. Isso é sempre um erro. Não é preciso recuar muito na história, para termos o contraditório. Basta lembrar o Chanceler Helmut Kohl. Foi, na altura, confrontado com uma envolvente conjuntural em tudo idêntica à actual. Foi o mentor e executor da reconciliação com a Alemanha de Leste. E, meus amigos, o tal sentimento de orgulho supremo era em tudo idêntico. A forma como desprezavam os vizinhos de Leste era a mesma com que hoje desprezam a Grécia, Portugal, Espanha, Irlanda... O julgamento popular era em tudo semelhante, na altura. Os Alemães de Leste era significativamente mais pobres, tinham fraquíssimos níveis de produtividade, e a economia era obsoleta. Ora isto comparado com o bem-estar da República Federal da Alemanha era uma afronta. Mais ainda quando a única ideia que era “vendida” no Ocidente, como propaganda, era o facto que iriam pagar mais impostos com a integração. Vejam como estas semelhanças são brutalmente idênticas às actuais.
Só que nesta altura emergiu um grande estadista que ficará para a História. Helmut Kohl ousou desafiar essa mentalidade, e por isso VENCEU. Hoje a Integração da Alemanha de Leste é um projecto conseguido e com elevado sucesso. Agradecem os que estavam do outro lado do muro de Berlim, pois a sua qualidade vida melhorou. Agradecem todos os Alemães, pois com a integração, tonaram-se a indiscutível melhor e maior economia da Europa. A prosperidade é inquestionável. Esta é uma lição factual. Não existe, em Economia, uma aritmética de resto zero. Não existe porque quando um ganha os outros também ganham. Quando um perde, os outros colapsam. Ganham todos quando quem lidera, olha para a “big picture” e não para o umbigo. São hipócritas os que querem dizer ao seus eleitores que o mal de uns é o bem dos outros. Foi esta a fórmula que Merkel encontrou para reinar e ganhar as eleições.
Não conoto politicamente o desastre anunciado de Merkel com qualquer cor política, até porque o grande estadista que referenciei, Helmut Kohl, é da mesma família política de Merkel (centro-direita). O que comparo é Estadistas com Políticos menores. Kohl deixou prosperidade, coesão, progresso, inclusão, crescimento, bem-estar, e o grande projecto Europeu. Merkel vai-nos deixar o desastre anunciado com a sua marca: empobrecimento, divisão, dívida, desintegração, suicídio (não é uma palavra vã), falências, desemprego, retrocesso…
As eleições deste mês vão dar uma vitória a Merkel, pelas razões que acima descrevi. A vitória pode ter 3 cenários: Maioria absoluta dos Democrata Cristãos de Merkel - CDU (Espero que não!), maioria com os Liberais (FDP) como no corrente mandato; ou maioria com os sociais democratas/socialistas –SPD (Solução menos má). A certeza é que infelizmente Merkel vai ganhar e a maioria dos Alemães vai ficar radiante.
Merkel não é
uma estadista, é uma marioneta do pior do orgulho germânico. Não vai ficar na
história, definitivamente. Ou se ficar, será pela herança pesada que deixou na
Europa. Pelo retrocesso no projecto mais bem-sucedido da história da
Humanidade: a construção Europeia. O continente onde, apesar de tudo, todos
querem viver. O mundo ridicularizou os Estados Unidos de G.W. Bush, hoje a
Europa é humilhada por Angela Merkel. Talvez por razões diferentes. Mas há uma
razão comum: ambos não têm talento nem capacidade para governar. Pior, são cobardes,
a troco de um qualquer fetiche, alienam a dignidade. A deles e a de quem representam.
Repudiante.
Um abraço a
todos
Joaquim